sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Para Luisa

Depois de tanta demora, nem sei mais o que escrever. É difícil, tenho que assumir. Nunca fui bom pra falar dos outros; agora, de você. É complicado, porque minha admiração pelas pessoas é totalmente subjetiva. Não admiro alguém porque ela é 1: legal, 2: divertida e 3: me entende. Não funciona desse jeito. Eu admiro pelo jeito de ter calma, pelo jeito de olhar e cuidar de alguém, e até pelo jeito que briga. Eu sou um apaixonado pelos detalhes, e são eles que me conquistam. O detalhe das pessoas que me conquista.

Mas não vim aqui falar de todas as pessoas, vim falar de você. Que prolixidade pra dizer. Tenho que pegar um dicionário pra achar as milhares de indefinições gramaticais que me engolem quando eu tento te definir. Vou tentar metaforizar.

Eu sou um pontinho tímido, um pontinho preto, melhor; eu vivo a minha vida conquistando as pessoas; apesar de tudo, eu sei conquistar. Não fui preto sempre. Já fui de muitas cores. Eu era branco quando nasci, mas fui ficando de várias cores; depende do que aconteceu comigo. Mas preto é uma cor que simplifica bem como eu sou. Escuro, com medo? Egoísta, não sei. Não gosto de falar disso, não gosto de dividir. Não adianta procurar em mim; só há escuridão.

Um dia eu encontrei outro pontinho, mas ele não era preto. Do mesmo jeito, a gente até que combinava. Ele me falava que ser um pontinho preto não era legal. Eu não entendia, já tinha passado por todas as cores e preto, indiscutivelmente, era a mais confortável. Mas não entendi o ponto de vista desse pontinho novo, desse pontinho que, apesar de conhecer muitas cores, continuava branco, pronto pra ser colorido.

Eu fiquei curioso. Comecei a conhecer esse pontinho. As coisas que ele falava eram totalmente absurdas pra mim. Não faziam sentido! Parecia um suicídio. Mas, enfim, eu dividia meu escuro ponto de vista. Que mal faria? Era até divertido conversar com alguém branco. Dava até uma nostalgia no fundo do meu corpo. Mas bem no fundo; não valia a pena querer voltar. Digamos que eram apenas reminiscências.

Um dia, depois de um tempo indefinido, descobri que ser preto não era legal. Foi quase uma obrigação mudar, mas mudei. Ser preto? Não tinha emoção; não dava. Tentei mudar de cor, tentei ser branco. Vivi minha vida durante um bom tempo tentando receber as cores que o mundo tinha a me oferecer, sentir os sabores coloridos e o cheiro das diversas flores. Era um verdadeiro arco-íris de sentidos. Ouvia a hortelã do ar, provava o amor de lábios, tocava em feridas antigas. Tudo de peito aberto, tudo com tinta neutra. Mas um dia, como se eu não esperasse, mas como se eu temesse, uma cor que eu não queria ver de novo apareceu. E tudo virou escuridão.

Você sabe bem do que eu estou falando.

O mausoléu de emoções, que um dia foram guardadas e enterradas, voltou. Eu sentia agonia, eu sentia ódio, eu sentia vontade de morrer, de matar. Eu não me sentia um
pontinho. Eu era... nada. Não me restava mais cores.

Devolva minhas cores! Eu as quero de volta. Eu poderia ser preto de novo, viver fechado, estranho, superficial. Mas desse jeito era pior do que deixar de ser um ponto, deixar de existir era melhor do que não ter cores. Eu queria mudar, podia ser preto.

Ah...! Mas eu nunca esqueceria o brilho, o cheiro, o gosto das coisas. O preto nunca mais voltou a ser suficiente, queria sentir as coisas; aquele velho gostinho da hortelã misturada com amor no final da tarde. Foi assim que eu aprendi a ser colorido, aprendi a mudar de cor.

Essas mudanças não acontecem de repente. São importantes e formam cada um dos pontinhos e o seu modo de viver.

Mas eu nunca vou me esquecer daquele pontinho que tentou me ensinar como a vida realmente podia ser boa, como os sabores que flutuavam e serpenteavam no ar estavam por aí justamente pra quem os queira sentir, cheirar, tocar. Vou lembrar pra sempre de quem tentou me mostrar todas essas coisas lindas e coloridas.

Foi aquele pontinho branco que sabia mesmo como viver, que falava umas coisas engraçadas e absurdas; que merecia viver pra sempre, só pela bondade dos olhos dele. Pela importância dada às pessoas. Nunca entendi essa viagem de incondicional.

Sem condições? Ah! Sempre tem uma condição. Pra você não, pontinho. Não existem condições pra você. Você aguenta. Porque você é único.

E porque eu te amo.


Artur Schütte

Um comentário:

  1. nunca vou me cansar de ler isso :) te amo, obrigada por tudo

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